quarta-feira, 27 de junho de 2012

Algumas considerações sobre estilo (Parte I)

         Por Luciana Messeder






Estilo s.m. 1 maneira peculiar de se expressar, de se vestir, de viver etc. 2 tendência artística 3 elegância 4 haste com o que os antigos escreviam em tábuas cobertas de cera. (Dicionário Houaiss)

A palavra estilo, atualmente, apresenta uma variedade de conceitos e, com eles, numerosas tentativas de defini-la. Tornou-se corrente em nossos dias chamar de estilo “tudo que possa apresentar características particulares, das coisas mais banais e concretas às mais altas criações artísticas”(Martins, 2000, p. 1).
No entanto, se procurarmos pela origem dessa palavra, veremos que seu significado era bastante específico e modesto. Segundo Martins “designava em latim – stillus – um instrumento pontiagudo, usado pelos antigos para escrever sobre tabuinhas enceradas e daí passou a designar a própria escrita e o modo de escrever” (Martins, op. cit., p. 1).
Apesar de sua origem modesta, os estudos acerca da língua e seus sistemas expressivos – a partir, principalmente, do século XX – tornaram a simples pergunta “O que é estilo?” além de embaraçosa, bastante complexa. [1]
Se acompanharmos historicamente os principais estudos – dentro de uma nova disciplina, a Estilística, surgida no século XX e ligada à Lingüística –, que envolvem as definições de estilo, veremos “que vários linguistas têm procurado classificá-las [as definições] de acordo com os critérios em que elas se fundamentam”(Martins: op. cit. p. 1). Dessa forma, “desvio de norma”; “elaboração”; “conotação”; “adição”; “escolha”; “conjunto de características individuais”; “conjunto de características coletivas”, são algumas definições do fenômeno estilo e, a partir delas, podemos vislumbrar a complexidade que tal estudo abarca.
Para a feitura do presente artigo, a definição que Othon Moacyr Garcia dá à palavra estilo será de fundamental importância:

“Estilo é tudo aquilo que individualiza obra criada pelo homem, como resultado de um esforço mental, de uma elaboração do espírito, traduzido em idéias, imagens ou formas concretas. A rigor, a natureza não tem estilo; mas tem-no o quadro em que o pintor a retrata ou a página em que o escritor a descreve” (Garcia, 1996, p. 103).

Estilo e Língua portuguesa

A língua é um repertório de possibilidades expressivas, um sistema posto à disposição dos usuários que o utilizam de acordo com suas necessidades de expressão. Cada usuário pratica uma escolha, i. e., um estilo, quando produz enunciados.
No domínio da Língua portuguesa várias obras se ocupam do estudo de sua expressividade. Um importante estudo, sem dúvida, é Contribuição à estilística portuguesa (1952), de Mattoso Câmara Jr., na qual o autor considera a Estilística uma disciplina complementar da Gramática, pois enquanto esta estuda a língua como meio de representação da realidade, a Estilística estuda a língua como meio de expressão. Para o citado autor, o estilo seria justamente um tipo de uso da língua que ultrapassaria o plano intelectivo, alcançando efeitos expressivos. [2]
As possibilidades estilísticas da Língua portuguesa, isto é, “os meios que ela oferece aos que falam ou escrevem para manifestarem estados emotivos e julgamentos de valor, de modo a despertarem em quem ouve ou lê uma reação também de ordem afetiva” (Martins, op. cit., p. 23), podem ser examinadas em três níveis, a saber: fonético, léxico e sintático.
Dessa maneira, o fato estilístico pode ser apreendido por meio da Estilística fônica (valores expressivos de natureza sonora observáveis nas palavras e no enunciado); da Estilística léxica (aspectos expressivos das palavras ligados aos seus components semânticos e morfológicos) e da Estilística sintática (valores expressivos ligados à constituição das frases). [3]

Notas


[1] Processo análogo ao que ocorre com a pergunta “O que é literatura?”.

[2] Aqui vale uma reflexão acerca da relação Expressividade/Literatura: ao longo do século passado, estudiosos renomados como Leo Sptzer, Erich Auerbach, Dámaso Alonso e Amado Alonso observaram em seus estudos que todo trabalho literário pressupõe uma reflexão acerca dos recursos expressivos da língua. Assim, a partir de suas investigações, puderam comprovar que na obra literária o fato estilístico atinge sua máxima intensidade. Essa corrente, conhecida como Estilística literária, como nos lembra Martins, tinha como objetivo a busca pela natureza poética do texto. Vale lembrar que, de acordo com a autora, “o conhecimento da língua do ângulo da expressividade constitui o passo inicial para a compreensão e valoração dos textos literários” (Martins, op. cit., p. 23).

[3] Torna-se importante ressaltar a flexibilidade desses três níveis: se no nível fônico, i. e., a parte sonora da língua encontramos um repertório bem delimitado – não há possibilidade de o falante criar novos fonemas –, nos domínios léxico e sintático observamos que o usuário possui uma liberdade mais ampla, o que lhe permite a possibilidade de produzir um número infinito de frases novas, compreensíveis e gramaticalmente corretas.


Referências Bibliográficas
CÂMARA, Jr., Mattoso. Contribuição à estilística portuguesa, 1952.
GARCIA, Othon Moacyr. Comunicação em prosa moderna: aprender a escrever, aprendendo a pensar.  Rio de Janeiro: Editora fundação Getúlio Vargas, 1996.
HOUAISS, Antônio e VILLAR, Mauro Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2003.
MARTINS, Nilce Sant’Anna Martins. Introdução à estilística: a expressividade da língua portuguesa. São Paulo: T. A. Queiroz, 2000.


P.S.: Em breve publicarei a Parte II.

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