Alguns tópicos sobre Macunaíma (1928),
de Mário de Andrade:
- Herói sem caráter: é uma analogia à formação da identidade brasileira que, tal como o herói (anti-herói), possui uma identidade cultural flutuante, em construção.
- Mário de Andrade trabalha com temas da literatura oral, que são universais, emprestando “cores” locais a estes temas. Macunaíma é uma variante desta literatura, pois se mantém fiel à sua estrutura. O autor rompe completamente com a verossimilhança: o herói se desloca geograficamente (anatopismo) e temporalmente (anacronismo) rompendo as fronteiras do verossímel, pois no maravilhoso tudo é possível.
- A lógica da narrativa é o trabalho do autor com diferentes materiais, colhidos na cultura popular e reunidos à maneira dos rapsodos (fazendo os ajustes, colagens e montagens necessários), dando forma a uma configuração híbrida.
- A ironia e a sátira que o autor empresta ao discurso do estudante de direito (ridicularizando a gramatiquice dos puristas e a retórica bacharelesca) e ao orador de praça pública (que discursa prolixamente sobre o “dia do Cruzeiro”) são alguns exemplos desta ironia corrosiva presente na obra.
- Linguagem de Macunaíma: através de pesquisas sobre as diferentes manifestações lingüísticas, Mário organiza um “arsenal” de temos da cultura popular, fazendo por meio da linguagem um mapeamento etnográfico do Brasil. Durante toda a narrativa encontramos diversos episódios etiológicos de e etimológicos, nos quais Mário de Andrade “brinca” com essas origens (por exemplo, a invenção do futebol, do truco, da palavra “puíto”, da expressão “vá tomar banho”, do gesto “uma banana”, dentre outros).
- Outro ponto importante acerca da linguagem de Macunaíma é a paródia lingüística e estilística, recurso notadamente empregado em “Carta pras Incamiabas”. Neste episódio o autor colhe do linguajar quinhentista termos arcaicos que, mesclando-se com neologismos, fazem da carta (epístola, estilo de relato formal) uma grande sátira ao artificialismo da linguagem erudita cultuado pelas Academias. No plano compositivo da Carta, aproximamos o autor da influência oswaldiana (Memórias sentimentais de João Miramar). Torna-se curioso também notar que será apenas neste episódio que o autor retomará a utilização da pontuação. Além dos aspectos formais, a carta também apresenta (através da confusão de seu autor sobre o uso da língua falada “brasileira” e da língua escrita portuguesa) uma crítica ferrenha ao preconceito do plurilingüismo característico de um povo multirracial. Toda a rapsódia empregará uma linguagem oral (ortografia oralizada), coloquial e lúdica.
- Personagens: na criação de seus personagens, o autor utiliza vários recursos, como a apresentação de sua origem (por exemplo, Macunaíma e sua de tipologia mítica); deslocamento de personagem de uma cultura para outra (por exemplo, o rei Nagô) que é um recurso próprio da cultura oral; figuras da história do Brasil que se mesclam com os personagens ficcionais (por exemplo, Belmiro Gouveia, Bispo Sardinha); personagens míticos (presentes nas lendas indígenas e no folclore); personagens naturais (animais, vegetais e minerais) e ainda, personagens contemporâneos, podendo estes ser: ilustres (Rui Barbosa), de seu círculo de amizades (Blaise Cendrars, Raul Bopp) ou familiares (Ana Francisca de Almeida Leite Morais).
Um achado
imperdível na web é versão cinematográfica de Macunaíma. O filme de
1969, baseado na obra homônima de Mário de Andrade, foi escrito e dirigido por
Joaquim Pedro de Andrade.
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